O presente artigo objectiva a identificação de perigos e riscos em obras de infraestruturas enterradas em meio urbano, concretamente nos passeios, locais destinados à circulação pedonal.(...)(...) Pretende-se igualmente caracterizar o modo como o peão (sem qualquer formação em segurança), percepciona o perigo no obstáculo que terá de transpor e a maneira como resolve esta dificuldade. É também verdade que a segurança dos transeuntes que circulam nos passeios da nossa cidade pode ser caracterizada como uma «curta metragem» com desfecho imprevisível. Neste contexto podem surgir diversas situações, muitas delas claramente relacionadas com a ausência de cultura de segurança do peão, conjugada com o nível de segurança da EE (Entidade Executante). Existem portanto dois paradigmas, no que diz respeito à interpretação da segurança. Por um lado o utente da via (peão) e por outro a entidade que executa a obra (EE).
É precisamente sobre o desenvolvimento destes dois paradigmas que o presente trabalho se baseia; relacionam-se os cenários de ambas as partes interessadas à luz da sua cultura de segurança e das dificuldades apresentadas. Por último, transcrevo para estas linhas aquela que para mim é a mais importante razão que me motivou a escrever este artigo. Como profissional em pleno exercício achei que era oportuno e importante divulgar a experiência profissional em matéria de higiene e segurança acumulada ao longo de quinze anos de trabalho em obras de meio urbano. Pegando no que foi dito e tendo sempre como objectivo primeiro a prevenção de lesões é importantíssimo perceber como é que, em termos cognitivos, principalmente a nível da memorização dos espaços percorridos diariamente, o transeunte habitual daquela via, que por força das circunstâncias se vê de repente no «meio» da confusão, interpreta mentalmente o sucedido. É perfeitamente natural, e até por vezes bizarro, os peões perguntarem se podem circular e, no pior dos cenários, entrar numa zona de obra que está perfeitamente sinalizada com os sinais corretos e no devido lugar.
Introdução Direi, então, o que acontece quando modificam sem aviso o meu «caminho das pedras». A razão deste artigo é elucidar colegas de profissão e cidadãos comuns sobre os perigos e os riscos inerentes à atividade de higiene e segurança no trabalho em obras de subsolo que se realizam em ambiente urbano, que aparentemente se pensa serem muito simples para quem as olha ao «largo», mas muito complexas para o técnico que está nelas «envolvido». Pretende-se fornecer igualmente esclarecimentos referentes à aplicação da proteção colectiva que, neste caso e em muitas ocasiões, é a chave do sucesso, a par com a sinalização temporária de trabalhos na via e com a ideia da “confusão” que têm pela frente. Desenvolvimento Perigo - em qualquer actividade humana é algo intrínseco à sua condição natural. O modo como lidamos com o risco (leia-se que o risco é o produto entre a probabilidade X gravidade) associado ao perigo é algo que se enquadra numa cultura enquanto sociedade. E coloca-se a questão de como avaliamos o risco e como o consideramos mais ou menos importante. Tomando como exemplo este tipo de empreitada a mesma contém situações manifestamente perigosas. Englobamos nesta categoria a circulação automóvel nos dois sentidos da via a interagir com a circulação pedonal e os desníveis no pavimento. Não sendo a fotografia esclarecedora em alguns aspectos é perceptível um conjunto de características que fazem parte da arquitectura do espaço (via). Refira-se, a propósito, a existência de pequenos parques de estacionamento que se situam paralelamente ao eixo da via, o mau estado do pavimento e a existência de uma recta sem que haja no interior da mesma algo que obrigue a quem aí circula a reduzir a velocidade.
No entanto, este raciocínio não está completo, ou seja, se os pontos referidos anteriormente não forem controlados, entramos, sem o desejar, na zona do risco não aceitável, item relacionado essencialmente com probabilidade de ocorrência de um determinado dano a que se junta a frequência de exposição. No terreno o que temos é o seguinte panorama: se o condutor não respeitar a sinalética vertical e temporária, além da permanente colocada na via, temos problemas, o mesmo acontecendo se, hipoteticamente e por razões logísticas ou outras, não se avivar a «série» de sinais horizontais marcados no pavimento. De certeza que o resultado é o mesmo risco não aceitável. Em conclusão, o caminho para a compreensão do fenômeno da chamada safety (Higiene Industrial e Segurança no Trabalho) é longo, sendo que o primeiro passo é entender o relacionamento e a conecção entre estes dois vectores (perigo/risco e vice-versa) porque, como diz o cidadão comum e não só, toda atividade humana tem riscos, mas a interpretação dos perigos prepara-nos muito melhor para as tarefas que porventura tivermos em mãos, obrigando-nos por isso a executar boas práticas em detrimento dos comportamentos de risco. No entanto, da associação feita anteriormente pode resultar acidente. O mesmo normalmente está relacionado com um acontecimento não planeado e muito menos controlado, do qual resulta direta ou indiretamente uma lesão corporal, perturbação funcional ou doença, tendo aqui que ser incorporada a noção de probabilidade. Mais se acrescenta que poderão surgir sinais (pequenos acidentes que não causam lesões, mas só danos materiais) que nos indicam que algum aspecto vai ter que ser analisado e corrigido. Ui! Modificaram o meu caminho das pedras A este propósito olhemos para o ato de aprender e para uma das suas definições: mudança relativamente estável e perdurável no tempo do comportamento ou do conhecimento devido à experiência, ao treino e ao estudo acrescentado de uma vertente adaptativa em relação ao meio e às mudanças.
Consideremos ainda outro nível de aprendizagem ligado à habituação, tendência a responder a estímulos que se tornam familiares. A este respeito é normal ouvir-se, devido à exposição sucessiva aos mesmos: «Não tem problema algum, eu conheço bem a minha rua, estou habituado a andar no meio dela, a mesma nunca mudou a sua arquitetura». Bom, o resultado de tudo isto entronca no seguinte: aprendemos a ignorar estímulos conhecidos (os barulhos habituais da rua, a sinalização vertical e permanente colocada e os buracos na calçada que não são tapados há séculos), não portadores de informação nova, aumentando desta forma a nossa capacidade de adaptação a outras aprendizagens. Por último, consideremos o comportamento operante ou instrumental e, no âmbito do mesmo, o chamado reforço negativo, que é a meu ver o principal agente causador de acidentes, principalmente com os transeuntes. Escalpelizando o que foi dito, o que acontece é isto: o peão, confrontado com o novo cenário (antigamente ia em frente, agora tem de virar à direita), evita a situação desagradável e incomoda se o seu comportamento for outro. Por outras palavras é a eliminação do estímulo que permite evitar a tal situação que não se quer.
Concluindo, direi que o conjugar destes factores e premissas cognitivas poderão explicar, e sobretudo ajudar, quem está no terreno (frentes de obra), a compor e a «trabalhar» a obra no sentido de tornar o peão, que é ao fim ao cabo um condicionalismo, num «colaborador» que, como correntemente se diz, «corre por fora», mas que poderá ser uma mais-valia de valor acrescentado na empreitada no que diz respeito à prevenção de acidentes.
0 Comentários
Seja Bem Vindo ao Grupo Trabalho Seguro Vida Futura, agradecemos sua visita, e aguardaremos seu retorno.