Um dos principais problemas de saúde pública
associados à concentração de automóveis nos centros urbanos é o relativo à
composição dos produtos de exaustão de seus motores de combustão interna. A
composição dos gases emitidos é analisada principalmente em função dos
componentes que causam maiores problemas aos habitantes das concentrações
populacionais urbanas sejam, o monóxido de carbono, óxidos de nitrogênio,
hidrocarbonetos, aldeídos e o próprio combustível remanescente da combustão.
Uma vez conhecendo os efeitos gerados pela
exposição aos derivados de petróleo visou-se fazer um levantamento de possíveis
efeitos dos combustíveis derivados de petróleo e álcool, sobre a saúde de
trabalhadores expostos ocupacionalmente em alguns Postos de Abastecimento de
Veículos Automotores (PAVAs), da cidade de São Paulo, através da correlação do
tipo de atividade ocupacional com as possíveis alterações decorrentes do
contato e manipulação dos produtos combustíveis comercializados nestes Postos
para sugerir medidas preventivas e/ou corretivas no intuito de minimizar os
possíveis efeitos na saúde destes trabalhadores.
Para isso foram estudados 69 trabalhadores
distribuídos em 11 PAVAs da cidade de São Paulo escolhidos aleatoriamente
dentre muitos existentes na cidade, não levando em consideração a distribuidora
à qual a empresa é filiada, a localidade, o tamanho, o número de funcionários
ou a quantidade de litros de combustível comercializados por mês.
Considerando que no Brasil ocorre a
utilização, além da gasolina e do diesel, também do álcool, como agentes
energéticos para o funcionamento dos motores a explosão, foram avaliadas as
possíveis alterações na integridade física dos trabalhadores de (PAVAs), da
cidade de São Paulo expostos a tais combustíveis em função da sua atividade
funcional, já que a capacidade lesiva desses compostos é de longa data estudada
e relatada, mesmo depois da criação dos combustíveis modernos como a gasolina
oxigenada e reformulada.
Em trabalhos descritos na literatura, foram
mencionadas alterações metabólicas e funcionais ocasionados pela exposição à
gasolina, óleo diesel e álcool, em diferentes sistemas biológicos apresentados
ao organismo, como respiratório, hepático, reprodutor, nervoso, renal,
hematológicos, ópticos, imunológicos, de desenvolvimento, e outros, podendo até
a levar ao câncer e a morte. Quando o contato é realizado por via oral, os
efeitos mais encontrados são os cardiovasculares, respiratórios,
gastrintestinais, hematológicos, hepáticos, renais, neurológicos, câncer, até
mesmo a morte. Já com relação à via dérmica, os danos observados foram às
dermatites, escamação e hepáticos, enquanto que por via respiratória, os
efeitos se mostram mais prejudiciais à saúde, podendo gerar efeitos
respiratórios, hematológicos, musculoesqueléticos, oculares, imunológicos,
neurológicos, reprodutivos, de desenvolvimento, genotóxicos, câncer e morte.
Neste trabalho, o levantamento de dados
dividiu-se em 3 itens; no primeiro enfatizou-se a identificação e perfil do
trabalhador, considerando sexo, idade, naturalidade, altura, peso e os hábitos
de fumar e consumir bebida alcoólica, onde o interesse foi o de conhecer melhor
a amostra populacional estudada, podendo assim separá-la em grupos para melhor
avaliação, além do interesse da apresentação entre o trabalhador e o
pesquisador, diminuindo assim as resistências geradas pelo desconhecimento
entre as duas pessoas.
Dentre as empresas pesquisadas, foi possível
observar que na cidade de São Paulo, o emprego de trabalhadores do sexo
masculino é bastante superior (cerca de 75%), em relação às pessoas do sexo
feminino (15%). No estudo foi constatado que a grande maioria (66,5%) dos
trabalhadores das empresas avaliadas são oriundos da região nordeste do país,
sendo o restante dividido em 26% com origem na região sudeste, 6% da região sul
do país e 1,5% de origem estrangeira, tendo a idade média dos trabalhadores
entre 20 e 40 anos (75%), com nível de escolaridade precário ou até mesmo
ausente, gerado provavelmente pela miséria existente nessa região do país,
levando ao êxodo rural e a conseqüente busca do emprego de mão de obra não
especializada, como a de PAVAs, ou pela falta de oportunidades existente na
região natal dos trabalhadores, ou a ilusória oportunidade de emprego nas
grandes metrópoles do país.
Com relação ao hábito de fumar, observou-se
que 30% dos trabalhadores fumam e, este hábito, além de causar malefícios à
saúde dos trabalhadores, é um importante fator de risco na geração de acidentes
de trabalho, uma vez que o cigarro neste ambiente de trabalho é proibido por
lei (lei 9.120 de 08/10/1980) na cidade de São Paulo. Entretanto, apesar do
risco, observou-se que esta lei nem sempre é cumprida pelos trabalhadores dos
PAVAs pesquisados.
No tocante ao consumo de bebida alcoólica,
este foi detectado em 56% dos trabalhadores analisados; aparentemente, segundo
os resultados obtidos, este hábito não causa nenhum malefício a atividade
destes trabalhadores, mas existe o risco de insuficiência hepática gerada pelo
contato do organismo com os compostos presentes nos combustíveis, que se agrava
com o hábito de consumo de bebidas alcoólicas, uma vez que o álcool é
reconhecidamente hepatotóxico.
No segundo item da pesquisa foram abordados
os antecedentes para morbidade, enfocando-se a possível existência de
interferentes que pudessem prejudicar os parâmetros avaliados no trabalho, tais
como: existência de alguma doença grave, doenças anteriores como anemia,
hepatite, diabetes, leptospirose, esquistossomose e edemas, e quanto ao uso de
medicamentos. No total da amostra, cerca de 9% dos trabalhadores relataram já
ter tido algum tipo de doença. Já, quanto ao uso de medicamentos, apenas 8% dos
trabalhadores mencionaram ser usuários de algum tipo de medicamento, o que para
o trabalho trata-se de uma informação relevante, pois a quantidade de
trabalhadores é relativamente pequena, e os medicamentos mencionados, são
medicamentos de uso rotineiro pela população, como analgésicos e
antiinflamatórios onde o uso não poderia levar a possíveis efeitos somatórios
com os agentes estudados ou a alterações hepáticas prejudiciais, que pudessem
interferir nos resultados.
Sobre os tipos de agentes químicos presentes
no ambiente de trabalho e o tempo de contato com os mesmos, analisados no
segundo item, a pesquisa revelou, quase que exclusivamente, o contato dos
trabalhadores com a gasolina, álcool e óleo diesel, o que foi bastante útil
para o trabalho, que tem como objetivo principal levantar informações acerca
dos efeitos destes agentes sobre a saúde ocupacional destes indivíduos, sendo
os frentistas os trabalhadores de maior contato com os agentes estudados.
O estudo da relação
processo-trabalho/morbidade dividiu-se em vários sub-itens, sendo que no
primeiro foi avaliado o tempo de trabalho na empresa, a duração da atividade de
trabalho por dia e a função exercida pelos trabalhadores; o objetivo desta
análise foi o de identificar o(s) tipo(s) de agente(s) ao(s) qual(ais) cada
trabalhador era exposto, bem como o nível de exposição a tais agentes,
abordados anteriormente. Sobre estes parâmetros, observou-se que a rotatividade
de emprego destes trabalhadores é relativamente alta, uma vez que cerca de 62%
deles exercem suas funções no PAVA a menos de 3 anos, e 30% ainda não completou
seu primeiro ano de atividade na empresa. Já, os outros 38% apresentaram uma
permanência maior na empresa, (que se divide no período de 3 a 15 anos,
aproximadamente). Esta última informação, embora não aparente ser de grande
importância para o tema do trabalho, gera dificuldades, devido à grande
diversidade de ambientes de trabalho vivenciados pelos trabalhadores
pesquisados, o que poderia interferir nos resultados obtidos. Este fato pode
estar associado ao método de administração de cada empresa e as normas exigidas
em cada posto de trabalho, gerando uma variação muito grande dos níveis de
exposição.
Sobre a ocorrência de alterações físicas
geradas pelo contato com os combustíveis estudados, a ocorrência de acidentes
de trabalho e o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), nenhum dos
trabalhadores pesquisados mencionou manifestações diretas relacionadas à
exposição, embora existam resultados tanto deste trabalho, como de outros, que
apontam a ocorrência de doenças geradas pela exposição ocupacional aos combustíveis
e um completo descaso ou desconhecimento por parte dos empresários do ramo, no
entendimento do fornecimento desses EPIs. A pesquisa revelou que a única
proteção encontrada nos postos de trabalho são os uniformes, que mais parece
tratar-se de um instrumento de propaganda que um mecanismo de proteção à saúde
dos trabalhadores, embora o uso de outros EPIs seja estritamente necessário,
como uso de calçados de segurança, máscaras respiratórias, luvas de borracha e,
em alguns casos, até mesmo protetores auriculares, para minimizar o ruído
gerado nas proximidades do ambiente de trabalho.
Ainda, quanto ao uso de EPIs, observou que,
em PAVAs, existe uma deficiência na educação sanitária dos trabalhadores, pois
observou-se que alguns EPIs, como botas e luvas de borracha, auxiliaram na
geração de lesões, principalmente do tipo dermatomicoses. Nota-se também que
não existe nenhum treinamento quanto ao uso desses equipamentos de proteção
individual, tanto por parte dos trabalhadores como por parte da administração,
sendo sugerido aqui, que as empresas implantem treinamentos sobre o assunto
para que os trabalhadores conheçam o risco ao qual estão envolvidos, o motivo
pelo qual são necessários os EPIs, e as maneiras corretas de utilização, além
da tentativa da educação sanitária aos trabalhadores como medida de prevenção
às ocorrências futuras.
O quarto item visou um breve histórico
profissional dos trabalhadores, buscando empregos anteriores, e há quanto tempo
existe a exposição aos combustíveis, assim como saber se houve algum tipo de
acidente nas empresas anteriormente trabalhadas, assim como o relato de doenças
ou sintomas provindos das atividades exercidas nessas empresas.
Também foram levantadas informações sobre as
condições do trato gastrintestinal por meio de questões diretas a respeito de
possíveis sintomas, assim como sobre a freqüência alimentar diária dos
trabalhadores. Aqui se pode averiguar que 41% dos trabalhadores pesquisados
possuem alguma queixa relativa à função gastrintestinal, como dor epigástrica
ou mal-estar, sendo que a grande maioria (cerca de 80%) não soube descrever
qual(is) seria(am) os fatores causadores dessas alterações. Parece que o
contato com os combustíveis comercializados nos PAVAs e a forma com o que
ocorre o contato é um grande indício das alterações gastrintestinais relatadas,
embora seja necessária uma amostragem maior e outros achados clínicos que
reforcem esta hipótese.
Outro resultado importante obtido nesta
pesquisa foi a quantidade de refeições realizadas pelos trabalhadores durante
um dia de trabalho. Embora exista uma maior prevalência de 2 a 3 refeições
diárias (ricas em alimentos considerados como básicos como grãos, carnes
vermelhas, farinha e pães), foi constatado que 100% da amostra mantém o hábito
de consumir alimentos, chamados pelos próprios entrevistados como “besteiras ou
supérfluos”, durante os intervalos entre as refeições. Este hábito, unido com a
falta de higiene alimentar, leva ao risco inconsciente de contaminação, pois o
alimento (normalmente próximo ao posto de trabalho) serve como transporte ao
organismo dos produtos nocivos a saúde, contidos tanto nos combustíveis
derivados de petróleo como no derivado da cana-de-açúcar como os xilenos,
tolueno, formaldeído e tributanol, utilizados na composição destes
combustíveis.
A análise dos resultados, foi possível
observar-se uma amostra de 31 trabalhadores (45%), que se queixa de dores de
cabeça freqüentes, principalmente após o termino de uma semana de trabalho. O
que chama a atenção é que 58% fazem uso de bebida alcoólica, e 42% não o fazem,
sugerindo uma possível interação entre os combustíveis inalados e/ou
manipulados e uma possível insuficiência hepática como aumento de enzimas
hepáticas como TGO (transaminase glutâmico-oxalacética) ou AST (aspartato
aminotransferase) e TGP (transaminase glutâmico-pirúvica) ou ALT (alanina
aminotransferase), causada pela exposição aos mesmos, levando às dores de
cabeça sem motivos aparentes, como mencionado pelos trabalhadores pesquisados e
os dados encontrados, podendo levar a casos extremos de neuropatias.
Segundo outros pesquisadores, o combustível
oxigenado (com MTBE, ETBE ou TAME, que são álcoois adicionados ao combustível)
possui a característica de aumentar a quantidade de formaldeído (no intuito de
diminuir as emissões de CO), este formaldeído depois de metabolizado se
dissocia em hidrogênio e formaldeído, que, por sua vez, é considerado o
subproduto tóxico do metanol usado como matéria prima na produção dos éteres utilizados
na gasolina oxigenada ou reformulada, que quando expostos à saúde humana leva a
manifestações como irritação de olhos, sensação de ardor na garganta e nariz,
dores de cabeça, náuseas, vômitos, tosses, falta de sono, dificuldade de
concentração, desorientação e até mesmo problemas neurológicos e psicológicos,
o que mostra que os sintomas pelos quais os trabalhadores se queixam podem ser
provenientes realmente da manipulação dos combustíveis estudados.
Sobre as características da pele dos trabalhadores
dos PAVAs, foram detectados 8% dos trabalhadores com alguma lesão de pele,
sendo estas do tipo dermatite de contato, com exceção de um caso, cuja
alteração foi gerada por micose de praia. Embora seja uma amostra relativamente
pequena, foi possível, através da comparação com a literatura descrita,
verificar que o contato com os combustíveis é capaz de gerar tais alterações
dérmicas (como as dermatites de contato). Um dado que pode ser levado em
consideração é o fato de que os trabalhadores portadores dessas alterações, as
possuem em regiões de maior contato com os combustíveis como membros superiores
e tronco, locais estes, onde o contato direto com a pele se dá principalmente
pelo fato de os uniformes permanecerem sujos por tempo prolongado com os combustíveis.
Sobre as condições respiratórias avaliadas
buscou-se saber se o trabalhador possuía alguma dificuldade para respirar,
procurando encontrar alguma deficiência respiratória provocada pelo contato com
os combustíveis, já que esta é a via de maior contaminação. Na amostra
avaliada, notou-se que 25% dos trabalhadores avaliados possuem alguma queixa
respiratória, sendo que, desses, 35% possuem o hábito de fumar e 65% não o tem,
confirmando que o contato com esses compostos químicos pode levar a doenças
respiratórias, mesmo havendo interferentes pela poluição atmosférica encontrada
nas grandes metrópoles.
Por fim, foram investigadas as funções
neuropsíquicas, buscando-se avaliar a ocorrência de dores de cabeça e tonturas.
Neste aspecto observou-se o maior índice de queixas (54%) entre todas as
citadas pelos trabalhadores. Deste total, 45% deles são portadores de dores de
cabeça sem motivos aparentes e, deste percentual, 58% apreciam bebidas
alcoólicas e 42% não cultivam esse hábito. Em relação às tonturas, houve
queixas de 26% dos trabalhadores, sendo 67% deles consumidores de bebida
alcoólica e 33% não consumidores. Sobre esta queixa, as possíveis correlações
com a exposição a agentes químicos ficam comprometidas, pois, é importante
lembrar que os hábitos (alimentares e outros) da população avaliada são
bastante irregulares e incorretos, podendo gerar deficiências nutricionais que
interfeririam neste estudo.
Assim sendo, e conforme os resultados aqui
obtidos, pode-se inferir que o contato com produtos combustíveis, bem como a
sua manipulação ocupacional pelos trabalhadores dos PAVAs, pode causar certas
modificações no organismo dos mesmos, nos dando subsídios suficiente para
concluir que a exposição ocupacional aos combustíveis comercializados nos
PAVAs, podem causar prejuízos como alterações gastrintestinais, dores de
cabeça, tonturas, irritação de olhos, alteração de sono, alterações dérmicas e
queixas respiratórias ao organismo humano, representado nesta pesquisa pelos
trabalhadores dessas empresas. Tais alterações são mais evidentes entre os
trabalhadores que têm contato mais direto com os produtos combustíveis que
aqueles que mantém contatos esporádicos com esses agentes mencionados.
Desta forma, é possível sugerir a
necessidade de, no mínimo, o uso de proteção individual, como luvas de
borracha, avental de borracha, calçado impermeabilizante e proteção
respiratória, adequado para cada tipo de combustível comercializado, além da
conscientização de todos os trabalhadores expostos aos produtos comercializados
nos PAVAs, da capacidade lesiva dos combustíveis, através de programas
informativos e de treinamento adequado para a manipulação segura destes agentes
químicos.
Ainda, por meio das entrevistas, foi
possível notar que a maioria dos PAVAs avaliados não possui informações
suficientes dos órgãos responsáveis por programas de educação, para se evitar
os problemas à saúde dos trabalhadores. Portanto, sugerem-se, com este
trabalho, que sejam inseridos treinamentos pelos representantes sindicais ou
governamentais, tanto estaduais como federais, para instruir essas empresas
sobre os riscos e efeitos à saúde existentes nesse ramo do comércio, que cada
ano aumenta mais devido a expansão da frota automobilística; além disso,
sugere-se, também, maior incentivo pela busca de combustíveis alternativos para
os veículos automotores, com menos riscos para a saúde humana e para o próprio
meio ambiente.
AUTORIA:
Denis D'Ambros - Biomédico
FONTE:
Dambros Tecnologia em
Segurança do Trabalho
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